Sermão da montanha




“Bem aventurados os tristes”

Huberto Rohden, em o livro: Sermão da Montanha
“Antes de tudo, convém distinguir duas espécies de tristeza e alegria, uma tristeza central, permanente, por vezes circundada de alegrias periféricas, intermitentes – e uma alegria central, permanente, que, por vezes, se acha envolta em tristeza periférica, intermitente
Em outras palavras: pode haver uma tristeza-atitude e uma alegria-atitude- como também pode haver uma tristeza-ato e uma alegria-ato. Pode alguém ser triste e estar alegre- como também pode ser alegre e estar triste. O que é decisivo é a atitude interna, permanente, negativa ou positiva. E essa atitude radica, em ultima análise, num profundo substrato metafísico, a VERDADE, ou então o seu contrário.



Quem tem a consciência reta e sinceridade estar na Verdade é profundamente alegre, calmo, feliz, embora externamente lhe aconteçam coisas que o entristeçam – quem, no intimo da sua consciência, sabe que não está na Verdade é profundamente triste, ainda que externamente se distraia com toda espécie de alegrias.
..."Quem teme a concentração necessita de toda a espécie de distrações para poder suportar-se a si mesmo. E, como essas distrações e prazeres, pouco a pouco,calejam a sensibilidade, necessita esse homem de intensificar progressivamente os seus estimulantes artificiais para que ainda produzam efeito sobre seus nervos cada vez mais embotados”.

...”Enquanto o homem não descobrir a bela tristeza da vida espiritual, tem de iludir a sua fome e sede de felicidade com essas horrorosas alegrias da vida material. Essas alegrias externas, porém, têm sobre ele o efeito da água do mar, que tanto maior sede quanto mais dela se bebe”.

... “ Ora, esse caminho não pode deixar de ser estrito e árduo, uma espécie de tristeza, como é toda disciplina; mas no fundo dessa tristeza externa dormita uma grande alegria interior. É todavia, uma alegria anônima, silenciosa, imponderável, como costumam ser os grandes abismos e as grandes alturas. Aos olhos profanos, leva o homem espiritual uma vida tristonha e descolorida; o seu ambiente parece monótono e cor de cinza, como um vasto deserto.
E talvez não seja possível dar ao profano uma idéia da profunda alegria e felicidade que o homem espiritual goza, porque esta felicidade jaz numa outra dimensão, totalmente ignorada pelo profano. O homem habituado a certo grau de espiritualidade tem uma enorme vantagem sobre o homem não-espiritual: não necessita de estímulos violentos para sentir alegria, porque a sua alegria não vem de fora, e sim de dentro.



Basta-lhe uma florzinha a beira da estrada; basta o sorriso de uma criança a caminho da escola; basta o tanger de um sino ao longe; basta o cintilar de uma estrela através da escuridão –tudo enche de alegria, suave e pura, a alma desse homem, porque ela está afinada pelas vibrações delicadas que vêm das luminosas alturas de Deus”.



...” Por isso, a vida do homem espiritual é uma bela tristeza, ao passo que a vida do homem profano é uma pavorosa alegria. Mas o homem espiritual prefere a sua bela tristeza à pavorosa alegria do profano, que ele compreende perfeitamente, porque também ele já passou por esse estágio infeliz – ao passo que o profano não compreende a felicidade anônima do iniciado, porque nunca passou por essa experiência”.


... "Geralmente, os homens mais felizes são ignorados pela humanidade que escreve e lê livros e jornais, que fala do alto de púlpitos e das tribunas, que perde tempo com rádio e televisão ou procura salvar o gênero humano pela política.
Os milionários da felicidade são, quase sempre, os grandes anônimos da história, os “não-existentes”. Os poucos homens que aparecem em público são raras exceções da regra.
O grande exército dos “ bem-aventurados” não aparece em catálogos e cadastros estatísticos. São os irmãos anônimos da “ fraternidade branca” que estão presentes em toda a parte onde haja serviços a prestar, mas ninguém lhes percebe a presença, porque sempre desaparecem por detrás de suas obras.
Os muito ruidosos que se servem das suas obras como fogo de artifício de deslumbramento pirotécnico para iluminar a sua personalidade não fazem parte da “ fraternidade- branca”, porque não se eclipsaram no anonimato da benevolência universal.


Os verdadeiros redentores da humanidade são tão felizes no cumprimento da sua missão que nunca esperam pelos aplausos das platéias, mas desaparecem por detrás dos bastidores do esquecimento, no mesmo tempo em que terminam a sua tarefa. São igualmente indiferentes a vivas como as vaias, a aplausos como a apupos, a louvores como a vitupérios, porque eles vivem no mundo da silenciosa e profunda verticalidade invisível, incompreendidos pelos habitantes da ruidosa horizontalidade visível".

Bem-aventurados os que estão tristes – porque eles serão consolados”.
O Sermão da MontanhaLivraria Freitas Bastos SA
Rio de Janeiro, 1965.

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