Fernando Pessoa e os Símbolos

Vitral em forma de mandala, Catedral de Chartres, França.


Este texto está na introdução do livro: " Tipos e a diversidade humana", de José Zacharias, pautado na psicologia analítica e na tipologia de Carl G Jung, onde analisa com muita clareza as quatro funções da consciência: sentimento, pensamento, intuição e sensação.(*)


" Não há possibilidade de compreendermos a nós mesmos, sem percebermos que temos diferenças e semelhanças; isto faz parte da vida humana- somos ao mesmo tempo seres individuais e coletivos, e esta é a beleza da existência humana.


Acrescento nesta introdução um texto de Fernando Pessoa ( 1888-1935), no qual transparecem as quatro funções psíquicas de maneira muito poética.

No entanto, há no texto de Pessoa um quinto elemento que, talvez possamos dizer assim, é indicador do processo de individuação, para que cada um de nós realize o seu caminho e chegue a ser o que realmente é".


O entendimento dos símbolos e dos rituais simbólicos exige do intérprete que possua cinco qualidades ou condições, sem as quais os símbolos serão para ele mortos, e ele um morto para eles.
A primeira é a de simpatia; não direi a primeira em tempo, mas a primeira conforme vou citando, e cito por graus de simplicidade. Tem o intérprete que sentir simpatia pelo símbolo que se propõe a interpretar. A atitude cauta, a irônica, e deslocada – todas elas privam o intérprete da primeira condição para poder interpretar.
A segunda é a intuição. A simpatia pode auxiliá-la, se ela já existe, porém não criá-la. Por intuição se entende aquela espécie de entendimento com que se sente o que está além do símbolo, sem que se veja.
A terceira é a inteligência. A inteligência analisa, decompõe, reconstrói noutro nível o símbolo: tem, porém, que fazê-lo depois que, no fundo, é tudo o mesmo. Não direi erudição, como poderia no exame dos símbolos, e o de relacionar no alto o que está de acordo com a relação que está em baixo. Não poderá fazer isto se a simpatia não tiver lembrado essa relação, se a intuição a não tiver estabelecido. Então a inteligência, de discursiva que naturalmente é, se tornará analógica e o símbolo poderá ser interpretado.
A quarta é a compreensão, entendendo por esta palavra o conhecimento de outras matérias, que permitam que o símbolo seja iluminado por várias luzes, relacionado com vários outros símbolos, pois que no fundo, é tudo o mesmo. Não direi erudição, como poderia ter dito, pois a erudição é uma soma; nem direi cultura, pois a cultura é uma síntese: e a compreensão é uma vida.
Assim certos símbolos não podem ser entendidos se não houver antes, ou ao mesmo tempo, o entendimento de símbolos diferentes.
A quinta é menos definível. Direi, talvez, falando a uns, que é a graça, falando a outros que é a mão do superior incógnito.
Falando a terceiros, que é o Conhecimento e Conversação do Santo Anjo da Guarda, entendendo cada uma destas coisas que são a mesma maneira como as entendem aqueles que delas usam falando ou escrevendo".
Fernando Pessoa, 1978 , p. 43-44

(*) Vetor Editora, SP

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