AMANHECER E O ENTARDECER DA VIDA
Sobre as etapas da vida
O neurótico é, antes, alguém que
jamais consegue que as coisas corram para ele como gostaria que fossem no
momento presente, e, por isto, não é capaz de se alegrar com o passado. Da
mesma forma como antigamente ele não se libertou da infância, assim também
agora se mostra incapaz de renunciar à juventude. Teme os pensamentos sombrios
da velhice que se aproxima, e como a perspectiva do futuro lhe parece
insuportável, ele se volta desesperadamente para o passado. Da mesma forma que
o indivíduo preso à infância recua apavorado diante da incógnita do mundo e da existência
humana, assim também o homem adulto recua assustado diante da segunda metade da
vida.....
Talvez isto seja, no fundo o medo
da morte? Parece-me pouco provável, porque a morte ainda está muito longe e, por
isto, é um tanto abstrata. A experiência nos mostra, pelo contrário, que a
causa fundamental de todas as dificuldades desta fase de transição é uma
mudança singular que se processa nas profundezas da alma. Para caracterizá-la,
eu gostaria de tomar como termo de comparação o curso diário do Sol.
Suponhamos
um Sol dotado de sentimentos humanos e de uma consciência humana relativa ao momento presente. De manhã, o Sol se eleva do
mar noturno do inconsciente e olha para a vastidão do mundo colorido que se
torna tanto mais amplo quanto mais alto ele ascende no firmamento. O Sol
descobrirá sua significação nessa extensão cada vez maior de seu campo de ação
produzida pela ascensão e se dará conta de que seu objetivo supremo está em
alcançar a maior altura possível e, conseqüentemente, a mais ampla disseminação
possível de suas bênçãos sobre a Terra.
Apoiado nesta convicção, ele se encaminha para o Zênite imprevisto
- imprevisto, porque sua existência individual e única é incapaz de prever o
seu ponto culminante. Precisamente ao meio-dia, o Sol começa a declinar e este
declínio significa uma inversão de todos os valores e ideais cultivados durante
a manhã. O Sol torna-se, então, contraditório consigo mesmo. É como se
recolhesse dentro de si seus próprios raios, em vez de emiti-los. A luz e o
calor diminuem e por fim se extinguem."
Carl Gustav Jung em: A Natureza da Psique, § 778, Editora Vozes,
1998.
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