Oráculo de Apolo e a pitonisa
Templo de Apolo em Delfos, Grécia
O modo pelo qual funcionava o
oráculo de Apolo e de onde vinham os conselhos que dava, é um assunto
fascinante. Infelizmente pouco se sabe a respeito. O santuário era secreto; os
que o dirigiam e davam conselhos guardavam segredos sobre seus métodos. Platão
conta que a pitonisa, porta-voz de Apolo no templo, era possuída por uma “
loucura profética”.
Dessa ‘“loucura” emergia alguma “
inspiração criativa”, segundo Platão, que representava níveis de consciência
mais profundos do que os normais. “ À sua loucura” escreve no Fedro, “ devemos os muitos serviços que
a pitonisa de Delfos e as sacerdotisas de Dodona prestaram à pessoas e aos
Estados da Grécia, pois quando estavam completamente conscientes pouco ou nada
faziam”. É a interpretação de um dos aspectos da controvérsia sobre a
inspiração – até que ponto a criatividade vem da loucura?
Apolo falava na primeira pessoa,
através da pitonisa. A voz desta alterava-se, tornava-se áspera, gutural e
trêmula como a dos médiuns modernos. Diziam que o deus entrava no corpo da
pitonisa no momento do ataquem ou do entusiasmo,
como sugere literalmente a origem da palavra, em-theo (“ em deus”).
....O que realmente nos interessa é a função
do santuário como um símbolo comunal, que tinha o poder de trazer à tona o
pré-consciente e o inconsciente coletivo. O aspecto comunal, coletivo de Delfos
tinha bases sólidas: o templo foi, a principio, dedicado às deusas da terra, e
só mais tarde a Apolo. É coletivo também no sentido de que Dionísio, o oposto
de Apolo, tinha grande influência em Delfos.
.. Qualquer símbolo genuíno,
acompanhado do respectivo rito cerimonial, torna-se o reflexo das inspirações,
das novas possibilidades, da nova sabedoria e de outros fenômenos psicológicos
e espirituais, que não nos atrevemos a experimentar por nós mesmos..
De que modo eram interpretados os
conselhos das sacerdotisas? É o mesmo que indagar de que modo se interpreta um símbolo.
As previsões da pítia eram sempre expressas em linguagem poética, “ com
exclamações arrebatadas e onomatopaicas, misturadas à linguagem comum, e essa
matéria prima tinha de ser interpretada e organizada”. Como as informações
mediúnicas de todos os tempos, eram suficientemente enigmáticas não só para
permitir, como para necessitar interpretação. E sempre eram suscetíveis de duas
ou mais interpretações diferentes...
A orientação de Delfos não era
conselho no sentido rigoroso da palavra, e sim um estímulo para que o
indivíduo e o grupo se analisassem, consultando a sua própria intuição e
sabedoria. Os oráculos colocavam o problema sob um novo ponto de vista, num
novo contexto onde possibilidades ainda não imaginadas se tornavam evidentes. É
um erro pensar que esses oráculos, bem como a psicologia moderna, façam com que
o indivíduo se torne mais passivo. Isso significaria erro terapêutico e
interpretação falsa dos objetivos do oráculo. Fazem exatamente o contrário; levam
o individuo a reconhecer as suas possibilidades, trazendo à luz novos aspectos
de si mesmos e do seu relacionamento com os outros. Esse processo abre as
portas da criatividade. Faz com que o indivíduo se volte para os seus mananciais criativos”.
Rollo May em: A coragem de criar –
Editora Nova Fronteira.
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